O QUE É A IGREJA
Introdução
A minha missão nesta plenária é fazer uma breve apresentação sobre o tema “O QUE É A IGREJA”, e acredito que já passaram por aqui algumas pessoas que falaram sobre este tema, e possivelmente os irmãos já tiveram cursos, estudos e certamente já devem ter ouvido algumas mensagens sobre este tema. Não tento portanto, a intenção de trazer nada novo, mas apresentar aos irmãos aquilo que acredito ser a igreja.
O texto base da nossa reflexão está em Mateus 16:13-20. “13. E, chegando Jesus às partes de Cesaréia de Filipe, interrogou os seus discípulos, dizendo: Quem dizem os homens ser o Filho do homem? 14. E eles disseram: Uns, João o Batista; outros, Elias; e outros, Jeremias, ou um dos profetas. 15. Disse-lhes ele: E vós, quem dizeis que eu sou? 16. E Simão Pedro, respondendo, disse: Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo. 17. E Jesus, respondendo, disse-lhe: Bem-aventurado és tu, Simão Barjonas, porque to não revelou a carne e o sangue, mas meu Pai, que está nos céus. 18. Pois também eu te digo que tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela; 19. E eu te darei as chaves do reino dos céus; e tudo o que ligares na terra será ligado nos céus, e tudo o que desligares na terra será desligado nos céus. 20. Então mandou aos seus discípulos que a ninguém dissessem que ele era Jesus o Cristo.”
Este texto é conhecido de todos nós, possivelmente os irmãos já o conhece muito bem, mas ao ler este texto, observo três verdades importantes, nas quais a igreja precisa se estabelecer, a fim de ser igreja verdadeira:
1.A Identidade de Jesus
Deixa-me chamar a sua atenção para o verso 16: “Simão Pedro respondeu: Tu és o Cristo, o Filho do Deus Vivo.” No contexto desta passagem Jesus já havia pregado o evangelho em várias regiões há aproximadamente dois anos, já havia dado uma apresentação clara de sua identidade, como podemos verificar, por exemplo, no caso do seu encontro com a mulher samaritana, quando ela pergunta a identidade do messias, ele diz abertamente: “Eu o sou, eu que falo contigo” (João 4:26). E ainda no caso dos discípulos de João que foram ter com Jesus e lhe perguntaram: “És tu aquele que havia de vir, ou devemos esperar outro?”. E Jesus responde: “Os cegos vêem, os coxos andam, os leprosos são limpos, os surdos ouvem, os mortos são ressuscitados e aos pobres é anunciado o evangelho” (Mateus 11:2, 5). A resposta de Jesus é uma coletânea de profecias bíblicas relacionadas com as obras que identificariam o messias, como podemos ver, por exemplo, em Isaías 35:6: “Então os coxos saltarão como o cervo, e a língua dos mudos cantará. Águas arrebentarão no deserto, e ribeiros no ermo”.
Quando Jesus, portanto, reúne os seus discípulos e lhes pergunta: “E vós, quem dizeis que sou?” (v. 15). Ele não esperava nenhuma outra resposta, senão a que foi dada por Pedro: “…Tu és o Cristo, o Filho do Deus Vivo” (v. 16).
Há aqui algo importante, pois há pessoas que andam com Jesus há muito tempo, lêem a Bíblia, freqüentam cultos, mas são incapazes de dizer com suas palavras quem Jesus é. Mesmo depois de tantos anos de fé cristã, continuam incertos sobre a identidade de Jesus. Só é preciso que uma testemunha de Jeová bater nas portas das casas da maioria dos crentes, com uma conversa falsa que questiona a divindade de Jesus e os crentes ficam sem resposta. Vocês sabiam que um dos maiores grupos que se unem a seita dos testemunhas de Jeová são os dos crentes? Crentes sem fundamento bíblico, que não procura conhecer a Cristo, que não estão certos sobre a sua identidade.
A questão vai além de se tornar uma presa fácil para as seitas, mas a própria vida relacional com Deus, a satisfação na vida cristã, a esperança em Cristo, a fé e a firmeza nos tempos de adversidades, tudo isto depende do conhecimento que temos de Cristo. A pergunta mais importante que um crente tem para responder é: “Quem é Jesus?”
Devemos observar que antes de falar da igreja Jesus fala da necessidade de uma declaração de fé clara, de uma firme convicção sobre a sua identidade, pois sem ela, não há igreja. Há ajuntamento, há associações, clubes, etc. Mas igreja mesmo, só nasce de um conhecimento claro sobre a identidade de Jesus.
A Confissão de Fé Batista de 1689, também conhecida como “Confissão de Fé Londrina”, diz assim sobre a identidade de Jesus:
“O Filho de Deus, segunda pessoa da Trindade santa – sendo o próprio Deus eterno, o resplendor da glória do Pai, da mesma essência e igual ao Pai –, Ele fez o mundo, sustém e governa todas as coisas que criou. Quando veio a plenitude do tempo, ele tomou sobre si a natureza humana, com todas as suas propriedades essenciais e fraquezas comuns – porém, sem pecado.
E foi concebido pelo Espírito Santo, no ventre da Virgem Maria (pois o Espírito Santo desceu sobre ela e o poder do Altíssimo a envolveu). Foi nascido de mulher, da tribo de Judá, da descendência de Abraão e Davi, segundo previam as Escrituras.
Deste modo, duas naturezas completas, perfeitas e distintas foram inseparavelmente unidas, em uma única pessoa, sem conversão, composição ou confusão. E essa pessoa é verdadeiramente Deus e verdadeiramente homem; no entanto um só Cristo, o único mediador entre Deus e os homens.”1
É essencial compreender a maravilhosa identidade de Deus. Não podemos aceitar ou nos conformar com respostas baratas que diminuem a sua pessoa, é preciso conhecê-lo, investigá-lo e se relacionar com ele. Nenhum outro deus no mundo, em nenhuma outra religião possui uma identidade como a de Jesus, só ele é Infinito e Pessoal, todos os demais deuses ou são infinitos e impessoais ou finitos e pessoais.
Vejamos no hinduísmo, eles possuem duas categorias de deuses, deuses infinitos, mas com os quais o homem não pode se relacionar, há também os deuses pessoais, mais são finitos, pessoas que já morreram o irão morrer ou avatares. No islamismo é semelhante, Alá é um deus infinito, mas não é possível se relacionar com ele, é por isso que a Bilquis Sheikh, uma muçulmana convertida escreveu um livro chamado: “Atrevi-me a Chamar-Lhe Pai”, publicado no Brasil pela Editora Vida.
Jesus é Deus Infinito e Pessoal, ele é o Alfa e o Ômega, o princípio e o fim, aquele que é, que era e que há de vir, o Todo-poderoso (Apocalipse 1:8), mas também ele é aquele que entrou na casa de Pedro e tocou na mão de sua sogra doente (Mt 8:14-15), é aquele que entrou na casa de Lázaro, Marta e Maria, sentou-se com Maria aos seus pés e com eles falava (Lucas 10:38-42), ele é aquele que mesmo depois da sua ressurreição sentou-se com os homens e com eles comeu, sabemos até qual foi o prato (Lucas 24:43). E ainda hoje, continua conosco, aliás, seu nome é Emanuel, que quer dizer “Deus Conosco” (Mateus 1:23).
Vejamos que a pergunta de Jesus é objetiva: “Quem dizem os homens ser o Filho do homem?” (v.13). A pergunta de Jesus não é se as pessoas sabiam sobre sua família, que ele era filho de Maria, natural de Nazaré, ou mesmo se o reconheciam como um famoso mestre, pregador ou profeta. A pergunta de Jesus é muito clara: “Quem dizem os homens ser o Filho do homem?” Ele deseja saber a resposta relativa à sua identidade messiânica, veja, ele usa o termo: “…o Filho do homem”.
Este é o mesmo termo que Jesus sempre usou ao falar do Messias: “Porque o Filho do homem até do sábado é Senhor” (Mt 12:8); “Porque o Filho do homem veio salvar o que se tinha perdido” (Mt 18:11); “Desde agora o Filho do homem se assentará à direita do poder de Deus” (Lc 22:69); entre outras passagens. O que Jesus desejava é saber o quanto o povo e os discípulos haviam percebido da sua identidade divina. Portanto a resposta narrada por Mateus: “Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo” faz esta ligação entre a resposta dos discípulos em ressonância com aquilo que Jesus havia falado sobre o Filho do homem. Mateus deixa claro que Jesus é o Filho do homem, o Messias, o Filho de Deus.
É imprescindível que todo Cristão esteja seguro quanto à identidade de Jesus. Há muitos cristãos confusos e inseguros quanto à identidade de Jesus. A conseqüência disto é o esvaziamento do evangelho nas nossas mensagens. Hoje se faz de tudo no púlpito, discursos, declamações, conta-se anedotas, histórias, filosofias, estratégias, e o evangelho se foi. É preciso restaurar a mensagem do púlpito, é preciso trazer o evangelho novamente, é preciso por as nossas cabeças para pensar. Assim escreveu Martin Lloyd-Jones: “O que é a pregação? Lógica em chamas! Pregação é teologia vinda através de um homem que está em chamas!”2
Meus irmãos, falta chamas nos nossos púlpitos, falta paixão, falta poder do Espírito Santo. Esta chama santa do Espírito Santo, só virá sobre a vida do pregador que está saturado, repleto, a transbordar do evangelho.
Martin Lloyd-Jones diz ainda: “Volto a dizer que um homem que pode falar
sobre essas coisas sem paixão não tem o direito de estar em um
púlpito, e nunca deveria ser autorizado a subir em um.”3
2.Natureza de Jesus
A falta de uma identidade clara da pessoa de Jesus tem levado a igreja a viver de maneira diferente daquilo que é o ideal de Deus para nossas vidas. Resumindo todo o ideal de Deus para nossa vida em uma única frase dizemos que: “Deus deseja que sejamos a imagem de Jesus”. Nunca seremos capazes, nem aqui, nem na vida vindoura de sermos como Cristo em seu poder e glória, mas podemos ser em seu caráter, amor, e compaixão. Eli Stanley Jones escreveu: “Eu não conheço nada mais elevado para Deus e para o homem, do que ser à sua imagem”.4
O mundo sempre nos apontará caminhos diferentes, que contrariam a natureza de Cristo. A filosofia grega nos diz: “Seja moderado, conheça a si mesmo!” A filosofia Romana nos diz: “Seja forte, ordene a si mesmo!” O confucionismo nos diz: “Seja superior, corrija a si mesmo!” O shintoismo nos diz: “Seja leal, suprima a si mesmo!” O budismo nos diz: “Seja desiludido, aniquile a si mesmo!” O hinduísmo nos diz: “Seja separado, aprofunde-se em si mesmo!” O islamismo nos diz: “Seja submisso, acerte-se a si mesmo!” O materialismo nos diz: “Seja empreendedor, desfrute-se de si mesmo!” Mas a mensagem do cristianismo é: “Seja a semelhança de Cristo, e doe-se a si mesmo!”5
O apóstolo Paulo nos exorta: “…que haja em vós o mesmo sentimento que houve em Cristo Jesus” (Filipenses 2:5). Não há caminho mais elevado do que trilhar os caminhos percorridos por Cristo, o Deus aquém nós servimos e amamos.
Devemos atentar para a natureza da pedra. Não precisamos ser geólogos para entender que há pedras e pedras. Há o granito, o cristal, calcedônia, mica, basalto, gnaisse, sedimentares e estratificadas, e o quartzo. Cada uma reúne em sua natureza seus próprios tipos de minerais. As pedras mencionadas em Mateus 16:18, tem a mesma natureza. Neste caso a pedra principal, que é Jesus, compartilhou com a outra pedra, que é Pedro, uma figura simbólica de todos os crentes, a sua natureza.
O que chamamos aqui de natureza, a teologia identifica como atributos. Cristo compartilhou conosco não a sua natureza divina, aquilo que chamamos de atributos incomunicáveis de Deus, tais como independência; imutabilidade, eternidade (infinitude), onipresença, onisciência, onipotência e unidade. Veja o que escreveu o salmista: “Pois quem no céu se pode igualar ao SENHOR? Quem entre os filhos dos poderosos pode ser semelhante ao SENHOR?” (Sl 89:6).
Os atributos que Cristo compartilhou conosco, e que deve fazer parte da nossa natureza são seus atributos morais, também chamados de atributos comunicáveis, são eles: fidelidade, bondade, santidade, justiça, veracidade, amor, misericórdia e sabedoria. Veja o que diz a Bíblia: “Fala a toda a congregação dos filhos de Israel, e dize-lhes: Santos sereis, porque eu, o SENHOR vosso Deus, sou santo” (Lv. 19:2). Você já imaginou que privilégio maravilhoso? Todas as vezes que um ser humano demonstra bondade, misericórdia ou amor, estas demonstrações são reflexos de Deus na vida do homem. No entanto a nossa natureza caída, nos impede de desenvolver, de aperfeiçoar, de manter esta natureza de Deus em nós. Somente através de Jesus, que com sua morte na cruz venceu e destruiu o poder do pecado, pode nos libertar e nos tornar capazes de desenvolver estes atributos em nós. É por isto que Paulo nos encoraja a “desenvolver a nossa salvação” (Fp 2:12).
O que é o cristão? O cristão é aquele que foi salvo pela fé em Cristo e que com a sua vida reflete a natureza de Cristo como uma testemunha viva do poder salvador e transformador de Cristo. Este é o nosso chamado, dar testemunho com a nossa vida, com as nossas atitudes, com a nossa fé racional, de que somos de Cristo.
3.A dimensão de Jesus
Quero neste chamar a sua atenção para o verso 18: “Pois também eu te digo que tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela.” Nesta declaração de Jesus há duas pedras em questão. A primeira pedra é Pedro, no original πέτρος (Petros = lasca de pedra, pedaço de pedra). A segunda pedra é Jesus, no original πέτρα (Petra = rocha). As duas palavras fazem a designação do mesmo elemento: pedra. Jesus é pedra e Pedro é pedra, no entanto, na ênfase textual das palavras, há uma enorme diferença na dimensão destas pedras.
A primeira, Pedro, é aquela pedra que tomamos nas mãos e lançamos no rio, ou na praia. É aquela pedra ingênua, que sozinha é incapaz de qualquer coisa. Pedras desta magnitude só servem para alguma coisa se unidas há outras pedras, colocamos um pouquinho de cimento, misturamos com areia, então se constrói alguma coisa. Já a segunda pedra, é aquela que ao nos chocarmos contra ela com violência podemos morrer, é aquela pedra que se cairmos de cima dela nos partimos todos. A segunda pedra é aquela pedra imponente, sobre quem batem as águas violentas do mar, sem conseguir abalar a sua majestade. Esta pedra é Jesus!
O Apóstolo Pedro confirma estas duas imagens das pedras. Ele diz que nós somos estas lascas de pedras: “Vós também, como pedras vivas, sois edificados casa espiritual e sacerdócio santo, para oferecer sacrifícios espirituais agradáveis a Deus por Jesus Cristo” (1 Pe 2:5). Neste texto em particular Pedro usa outra palavra, mas com o mesmo significado literal, λίθος (lithos = pedra). Pedro então diz que estas pedras, que somos nós, inclusive o próprio Pedro, juntos, trabalhados por Deus, podemos edificar uma casa espiritual. Será que você percebe aqui porque o crente precisa estar unido com outros crentes na comunidade da igreja? Porque sozinho ele é uma pedra insignificante, chutada pela vida de um lado para o outro sem valor algum. Mas na igreja, unido com outras pedras, se transforma em casa espiritual e sacerdócio santo, para oferecer sacrifícios espirituais agradáveis a Deus.
Pedro também fala da segunda pedra: “E assim para vós, os que credes, é preciosa, mas, para os rebeldes, A pedra que os edificadores reprovaram, Essa foi a principal da esquina” (1 Pe 2:7). Pedro deixa claro em quatro versos (4,6,7,8), que esta pedra maior é Jesus. Ele é a pedra sobre a qual estamos edificados. Ele é a pedra da parábola os dois homens que construíram suas casas, um construiu sobre a areia e outro sobre a pedra. O que construiu sobre a areia perdeu tudo. Mas veja que a Bíblia diz sobre o que construiu sobre a rocha: “Todo aquele, pois, que escuta estas minhas palavras, e as pratica, assemelhá-lo-ei ao homem prudente, que edificou a sua casa sobre a rocha; E desceu a chuva, e correram rios, e assopraram ventos, e combateram aquela casa, e não caiu, porque estava edificada sobre a rocha” (Mt 7:24-25).
A igreja é esta casa sobre a rocha, é por isto que Jesus diz a Pedro sobre a igreja: “…as portas do inferno não prevalecerão contra ela…” (Mt 16:18).
Conclusão
Aos olhos deste texto onde o Senhor Jesus fala do estabelecimento da igreja, percebo que a igreja precisa desenvolver uma firme convicção sobre a identidade de Jesus e sobre esta identidade se estabelecer. A igreja é aquela que procura desenvolver a natureza de Cristo, através da palavra, da oração, do viver santo e da graça regeneradora de Deus. A igreja é aquela que é consciente da sua dimensão, do seu estado de dependência de Deus.
Bibliografia
Fé Para Hoje, Confissão de Fé Batista de 1689. São José dos Campos: Editora Fiel, 1991.
Preachers and Preaching, Zondervan, 1971 (tradução livre).
JONES, E. Stanley. The Christ of The Indian Road. New York: The Abingdon Press, 1925.
Fonte: Pr. Luis Alexandre Ribeiro Branco |para Seminário Teológico Baptista |16 de Março de 2011
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